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Dançam, os dois, no bailinho de domingo à tarde.

Ela acha que ele tem os dois pés esquerdos – ou direitos, pouco importa. O fato é que, passados todos estes anos e dançados tantos e tantos bailes, ele ainda não consegue acertar um passo e está sempre um pouco à frente ou um pouco atrás do ritmo. No ritmo, nunca.

E ela embrabece um pouco com isso.

Já ele acha que ela bem que poderia dar uma folga de vez em quando, ir ao baile um final de semana sim e o outro não, e deixá-lo ficar em casa um pouco mais sossegado, cuidando da hortinha de temperos que há anos cultiva ou escutando no rádio os programas esportivos que ela não agüenta. Mas não: todo domingo, ela consegue dar um jeito de enfeitiçá-lo e arrastá-lo ao baile. Quando vê, já estão no salão.

E ele embrabece um pouco com isso.

Dançam e ele pisa nos pés dela (há tantos anos). Ele pisa nos pés dela e ela reclama (há tantos anos). Ele diz que não adianta reclamar, que ela sabe que ele não sabe dançar e que nunca aprenderá (há tantos anos). Ela diz que ele podia se esforçar um pouco mais (há tantos anos). Ele diz, rindo, que ela que pegue um outro para dançar (há tantos anos). Ela diz, rindo, que vai pegar mesmo (há tantos anos).

E seguem dançando.

Reclamando um do outro, se provocando o tempo inteiro – mas sem dar bola a mais ninguém.

Até que ela diz que precisa ir ao banheiro. E declara que vai mancando, de tanto pisão nos pés que levou. Ele diz a ela que vá, que vai esperá-la sentado, tomando uma cerveja, e que ela não olhe para nenhum marmanjo no caminho. Ela diz que vai olhar para o primeiro que aparecer.

Esta velha é a minha vida, pensa ele, enquanto ela se afasta.

Não vivo sem este velho, pensa ela, enquanto finge mancar.

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